A busca por novas modalidades de investimento tem se tornado uma prática “comum” no cotidiano dos investidores brasileiros. Até bem pouco tempo atrás, a seleção dos ativos a serem investidos era uma atividade dedicada, quase que exclusivamente, aos profissionais do mercado financeiro.

melhora na economia assim como a queda dos juros e a alta da bolsa proporcionam um ambiente propício à procura de investimentos mais rentáveis que a famigerada renda fixa.

Além disso, a massificação das indicações de investimento (afinal é impossível assistir a um vídeo no YouTube sem ficar a par da carteira de ações milagrosa do momento!) fez com que o interesse e a curiosidade das pessoas por produtos alternativos de investimento aumentassem.

Claro que além desse cenário, a inovação tecnológica e os novos modelos de negócios colaboram para o surgimento de maneiras diferentes de se ganhar dinheiro. E nesse contexto, o crowdfunding se encaixa como uma nova forma de investir para a pessoa física, democratizando o acesso ao mercado de capitais, e uma nova forma de captar dinheiro para as novas empresas.

Foto: Getty Images.

Assim como em qualquer outro tipo de investimento, o conhecimento sobre o produto e suas particularidade é o primeiro passo rumo ao sucesso. É muito importante entender os princípios fundamentais e o funcionamento desse mercado de forma que você consiga tomar melhores decisões sem ficar “refém” das indicações milagrosas ou investir sem nem saber do que se trata.

Esse artigo é o primeiro de uma série de textos sobre investimento coletivo. E para começar essa jornada nada melhor do que entender o que é Crowdfunding, suas modalidades e os participantes desse mercado.

O que é Crowdfunding?

A ideia por trás do crowdfunding tem relação com as conhecidas “vaquinhas”, em que um grupo de pessoas colaboram com seus recursos para um objetivo em comum

Como ele é baseado em ferramentas eletrônicas, funciona como uma espécie de “vaquinha” virtual e, portanto, possui um âmbito de atuação mais abrangente, tanto em relação aos contribuintes quanto em relação ao uso e destinação dos recursos arrecadados.

Foto: Unsplash.

Como o próprio nome indica, um grupo grande de pessoas (crowd) colabora com seus recursos para financiar (funding) determinada causa, ideia, projeto, produto ou negócio, utilizando-se, para isso, de uma plataforma eletrônica, como uma página na internet ou um aplicativo. 

O retorno desse investimento vai depender do formato em que o sistema de crowdfunding se organiza. Os modelos tradicionais são baseados em doações ou recompensas. Mas também existe o modelo baseado em investimento, que pode ser estruturado de diversas maneiras.

Vamos entender as características de cada formato.

Doações (donation-based)

Na modalidade de doação, os contribuintes doam os seus recursos sem receber nada em troca, nem mesmo o reembolso da quantia doada. Nesses casos, a intenção de colaborar é apenas contribuir para uma causa ou um projeto em que se acredita. 

E foi justamente nesse formato que em 1997 aconteceu o primeiro registro de crowdfunding quando uma banda de rock britânica financiou sua turnê através de doações on-line de fãs. Inspirado por esse método inovador de financiamento, o ArtistShare se tornou a primeira plataforma dedicada de financiamento coletivo em 2003. Pouco tempo depois, começaram a surgir mais plataformas e essa modalidade de financiamento cresceu constantemente a cada ano.

Esse tipo geralmente é realizado por instituições de caridade e outros grupos que apoiam causas assistencialistas.

Recompensas (reward-based)

Já o modelo de recompensas é baseado em brindes ou pré-venda de produtos ou serviços. Nesses casos, a intenção do contribuinte pode ser apenas o de adquirir, de forma antecipada ou a um valor inferior, o produto resultante do projeto financiado e, portanto, a recompensa consiste no próprio produto. 

As duas maiores arrecadações aconteceram através da plataforma Kickstarter e foram nos projetos: Star Citizen (jogo para PC) que tinha o objetivo de arrecadar US$ 500 mil e arrecadou US$ 36 milhões (!!!) e Relógio Pebble (smartwatch) que tinha o objetivo de arrecadar US$ 100 mil e arrecadou US$ 10 milhões.

Foto: Relógios Pebble.

No Brasil podemos citar os sites VakinhaKickanteCatarseBenfeitoriaDoare entre outros como exemplos de plataformas de crowdfunding de doações e recompensas, onde é possível tanto doar para uma causa específica como lançar o seu próprio projeto em busca de financiamento.

O importante aqui é perceber que esses dois modelos, de doações ou recompensas, não apresentam características de mercado financeiro. Os contribuintes disponibilizam seus recursos sem interesse, intenção ou promessa de obter retorno financeiro.

Investimentos (crowdinvesting)

E finalmente, quando algumas empresas oferecem aos potenciais contribuintes investidores uma expectativa de retorno financeiro, trata-se, portanto, da modalidade de investimento, agora com características marcantes de mercado financeiro e, portanto, sujeita à regulamentação e à fiscalização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Nessa modalidade, o investimento pode ser caracterizado por: direito de crédito perante a sociedade mais remuneração (conhecido como crowdlending), ou participação direta no capital social da companhia (equity crowdfunding), ou ainda, títulos representativos da dívida conversíveis em participação, modelo esse mais usual.

Vamos entender no detalhe o Crowdfunding de Investimento.

Crowdinvesting

Com o objetivo de captar recursos para o seu negócio, algumas empresas tem utilizado as plataformas eletrônicas de crowdfunding na internet para apresentar a sua ideia e o seu projeto como uma oportunidade de investimento a um grande número de pessoas.

Na prática, essa forma de levantar investimentos tem sido utilizada para preencher a lacuna na captação de recursos de um segmento bem específico de empresas nascentes, as startups, que encontram dificuldades de financiamento nas fases iniciais de desenvolvimento do seu produto/serviço.

Quer saber mais sobre o processo e os agentes envolvidos na captação de recursos da pequena empresa/startup, confira esse artigo: “Nem só de Ideias vivem as Startups – o Processo de Fundraising“.

Nesse modelo, em troca dos recursos aportados, as empresas oferecem aos investidores diferentes tipos de títulos, com características e prazos específicos, normalmente consubstanciados em um contrato de investimento. Esses contratos ou títulos podem representar participação no negócio, o chamado equity crowdfunding, ou valores mobiliários em geral.

No Brasil, essa modalidade de investimento permitiu a captação de R$ 46 milhões em 2018, um aumento de 451% na comparação com 2016. Já no número de investidores o aumento foi de 716%. E o crescimento continua em ritmo expressivo já que toda a captação de 2018 foi superada apenas nos três primeiros meses de 2019.

Estudos do Goldman Sachs sugerem que o mercado de equity crowdfunding atingirá cerca de US$ 1 trilhão em 2026

Participantes desse mercado

Nesse mercado, os principais participantes são as empresas de pequeno porte que captam investimentos através do crowdfunding, os investidores que aportam recursos em busca de retornos financeiros e as plataformas eletrônicas de investimento que são justamente os hubs de encontro entre empresas e investidores.

Quer saber mais sobre como o Brasil se posiciona nesse mercado em relação aos mercados mundiais, confira esse artigo: “O Brasil e o mercado mundial de crowdfunding“.

Empresas

Foto: Unsplash.

Essa modalidade de captação pública de recursos é permitida somente para as sociedades empresárias de pequeno porte, definidas como aquelas constituídas no Brasil, com receita bruta anual de até R$ 10 milhões, e que não são registradas na CVM como emissores de valores mobiliários. Cada empresa pode captar no máximo R$ 5 milhões por ano-calendário.

Investidores

Embora qualquer investidor possa participar das ofertas de crowdfunding de investimento, existem limites de aplicação estabelecidos, que dependem basicamente do perfil de renda ou patrimônio do investidor.

Como regra geral, os investidores podem aplicar, nesse tipo de oferta, no máximo R$ 10 mil por ano-calendário. Esse é um dos motivos que muitos consideram esse investimento uma das maneiras de se investir equilibradamente no capital de risco.

Caso a renda bruta anual do investidor ou o montante de seus investimentos financeiros seja superior a R$ 100 mil, esse limite pode ser ampliado para até 10% do maior desses dois valores, também considerando o ano-calendário. 

Plataformas

Foto: Unsplash.

As plataformas eletrônicas de investimento participativo são pessoas jurídicas, constituídas no Brasil, especializadas na intermediação das ofertas públicas de crowdfunding de investimento. Elas representam o elo entre os investidores e as empresas, e para isso atuam exclusivamente por meio de página na internet, programa, aplicativo ou meio eletrônico que fornece um ambiente virtual de encontro entre investidores e emissores.

Interessante notar que as próprias plataformas são fintechs (startups que trabalham para inovar e otimizar serviços do sistema financeiro) que auxiliam na captação de investimentos e consequente crescimento de outras startups. Esse é um exemplo de como a conexão no ecossistema empreendedor contribui para o desenvolvimento do mesmo.

Elas assumem diversas obrigações com respeito à orientação aos investidores, à divulgação de informações a respeito dos emissores e da oferta, à transferência de recursos do investidor às emissoras, e a aspectos legais e contratuais, incluindo a assinatura dos contratos de investimento e a entrega deles aos investidores. 

Além disso, assumem também função educativa, e devem preparar e disponibilizar aos investidores um material didático, visando orientar aos interessados as características, o funcionamento e os riscos desse tipo de oferta.

As plataformas devem ser registradas na CVM e cumprirem uma série de requisitos além de deveres perante às sociedades empresárias, aos investidores e às ofertas.

Quer saber mais sobre as plataformas eletrônicas de investimento coletivo, confira esse artigo: “12 plataformas de investimento coletivo – inclua o crowdfunding no seu portfólio“.

Ficou com alguma dúvida? Deixe seu comentário 🙂

E não perca a continuação dessa série de textos sobre investimento coletivo, onde falaremos sobre as ofertas, o contrato de investimento e o retorno para o investidor além dos riscos envolvidos nesse tipo de investimento.

Até lá!

Publicado originalmente no LinkedIn.


Tamara Ferreira Schmidt

Física, empreendedora, especialista em mercado financeiro com fortes habilidades analíticas e quantitativas. Movida pela curiosidade e pelo objetivo de fazer a diferença atuo com inovação em iniciativas independentes.

0 comentário

Deixe uma resposta

Avatar placeholder

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *